Conto – O preço do presságio

O frio da madrugada não acalmou os passos de Fabiana, que estava quase correndo. O motivo disso era muito estranho, no entanto, extremamente simples. Ela tinha presságios, sensações de perigo... Instinto estranho. Ela aprendeu a confiar muito neles, não era tola para ignorar... Pelo menos não de novo.

A primeira vez que ela sentiu isso, ela imediatamente ignorou. Havia sentido algo ruim e seu cérebro guiou-a à sua irmã, que estava fazendo uma viagem de avião. Como não quis ser chamada de louca, acreditou que era bobagem. No mesmo dia, recebeu a ligação que o avião caiu... E que sua irmã ficara tetraplégica. Uma simples intervenção, e tudo poderia ter sido diferente...
Na segunda vez, ela salvou uma amiga. Desta vez, aquela deveria ir à universidade de ônibus. Que foi incendiado no centro da cidade. E a amiga estava na casa na casa de Fabiana, que ofereceu uma carona. Mesmo com o impacto da sensação, ela não havia comentado sobre a situação. Usou como pretexto um trabalho universitário.

Mas hoje tudo estava diferente...

A moça já havia se acostumado com esses sentimentos, sabia que eles podiam vir a qualquer momento, até mesmo na mais inusitada das situações, só que dessa vez, ela era a possível vítima, o alvo da ameaça.

Por isso ela estava correndo, com o coração disparado, suor encharcando suas roupas e rosto. A paz havia acabado. As ruas mais movimentadas da cidade estavam desertas e a luz fraca. Mas nada mais importava, senão pela sua sobrevivência.

No desespero de não saber do que estava fugindo, do medo do desconhecido. Procurou um porto seguro nas ruas desertas, alguém que ela pudesse conversar, mesmo que não fosse falar do presságio, mas pra jogar conversa fora, distrair sua mente dessa preocupação.

Virou a esquina da rua principal, e avistou uma velhinha corcunda que carregava uma sacola plástica e estava vestida de uma blusa de lã, cor de musgo, uma calça preta. Ela caminhava lentamente, parecia estar sem rumo. Portanto, Fabiana resolveu se aproximar. Esse, foi o pior erro que ela havia cometido...

Ao alcançá-la, disse:

— Senhora, senhora... Tudo bem? Você está perdida?
— Não tanto quanto você — respondeu a senhora numa voz tão cortante e gélida como o frio.
— O que? Acho que a senhora se enganou — disse a moça, respirando fundo, com o coração disparado — acho que eu devo ir agora — se afastou virando as costas à senhora.
— Nunca me engano, eu não! Você vai ter que ir comigo, de uma forma ou outra, não adianta virar as costas — respondeu.
Instintivamente, ela olhou para o rosto da senhora e percebeu que ela tinha um aspecto esquelético, de certa forma monstruoso. Suas palavras com uma convicção ditatorial. Encarando-a, sem palavras, horror expressado em seu rosto, incapacitada de de mexer nenhum músculo sequer.

— Você andou tendo presságios, nós duas sabemos disso! — prosseguiu a outra mulher — isso é uma falha do meu mundo, não sei o que houve, mas você não pode ficar na Terra, não entre os mortais... Você sabe demais e salvou uma vida, por isso devo levar a sua!

— Afinal, quem é você? — perguntou Fabiana
— Muitos me chamam de Morte, outros de Destino, outros de Deusa, chame-me como quiser! Minha função é manter o equilíbrio entre o seu mundo e o meu, por isso venha comigo — sua voz estava mais severa agora.
O silêncio perdurou da outra parte.
A moça continuava imóvel, olhando para o espectro na sua frente. Poucos segundos depois houve um rugido  animal e monstruoso ensurdecedor e ao mesmo tempo sangue espirrou pelo chão e os dois corpos que ilustravam uma madrugada desapareceram e nunca mais foram vistos.
O equilíbrio havia sido estabelecido mais uma vez.

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